Cartas de Busca
Tendo já um conhecimento prévio das classes e tipos das variáveis mais acessíveis ao iniciante e de como elas se comportam, é hora de colocar mãos à obra e iniciar as observações. Em primeiro lugar é necessário ter uma carta de busca para a variável. Ela consiste em um pequeno mapa onde constam, além da variável, estrelas de comparação situadas no mesmo campo visual. As estrelas de comparação serão usadas para avaliar o brilho da variável no momento da observação e, sendo assim, elas vêm acompanhadas na carta pelas suas magnitudes, expressas sem o ponto decimal. Existem cartas de busca em diferentes escalas (aa, a, b, c, d, e...), desde aquelas que abrangem grande extensão - 10° ou mais (aa) - até as que abarcam apenas alguns minutos de arco (d, e, f), usadas quando a variável está muito fraca. A Associação Americana de Observadores de Estrelas Variáveis - AAVSO, disponibiliza gratuitamente pela internet milhares de cartas de busca para os mais variados tipos de estrelas. Recentemente (2004) ela os colocou também a versão das cartas em dois CD-ROMs, disponíveis gratuitamente aos interessados que a solicitarem. Com certeza o aficionado iniciante encontrará, de uma ou outra forma, a carta que procura. É útil ter também uma cópia do Variable Star Atlas, da AAVSO, que compreende 178 mapas cobrindo todo o céu. Nele estão plotadas milhares de variáveis com as respectivas estrelas de comparação. Outras associações ou grupos de Astronomia também publicam cartas de busca e isso pode acontecer quando elas não são disponibilizadas pela AAVSO, ou quando estas parecem insuficientes. É o caso de variáveis austrais mais fracas ou pouco observadas. Ao anotar suas observações deve-se citar qual foi a carta de busca e que estrelas de comparação foram utilizadas.
Exemplo de carta de busca
O Instrumento
É necessário ao menos um binóculo para começar a observar variáveis, embora existam algumas observáveis a olho-nu. O iniciante se sentirá mais seguro em sua observação tendo as estrelas de comparação no mesmo campo visual da variável, e neste aspecto o binóculo é insubstituível. Deve-se ressaltar que muitos observadores de grande experiência usam muito mais binóculos (de grande potência, é claro) do que telescópios. Um binóculo 7x50 pode abarcar um campo superior a 5° e, sob condições médias de observação, chegar a 8a. magnitude. Assim já se terão mais de duas centenas de variáveis ao seu alcance. O binóculo tem as seguintes vantagens:
a) a imagem que se vê não é invertida;
b) possui um grande campo visual, comparado ao telescópio, facilitando a localização da variável;
c) dois olhos enxergam bem melhor que um: a avaliação de brilho se reveste de maior certeza em sua conclusão, principalmente para estrelas próximas ao limite instrumental;
d) é um instrumento portátil, que pode ser transportado para qualquer lugar.
Um pequeno refrator de 60mm ou um refletor de 150mm, já possibilitará ao observador acompanhar milhares de estrelas variáveis, senão em todo seu ciclo de variação, mas pelo menos em sua fase mais brilhante. Observadores com instrumentos maiores se incumbirão de cobrir a fase mais fraca da estrela. Neste caso é preciso se levar em conta o local que se dispõe para observar. Se o aficionado morar em casa ou dispuser de um quintal onde possa montar o instrumento, melhor assim. Morar em apartamento também não inviabiliza a utilização do instrumento (desde que não haja um prédio exatamente em frente!). É preciso lembrar que a observação de variáveis requer constância em sua atividade. Esperar por um fim de semana com céu limpo para ir ao sítio e observar lá é contar com o incerto. Não perca a oportunidade sempre que o céu estiver descoberto.
A Estimativa de Brilho (Magnitude)
O produto final da observação de uma estrela variável é a determinação de seu brilho aparente, ou - dito de outra forma - de sua magnitude visual. O método é muito simples. Ao localizar o campo visual onde está a variável, o observador identifica - com a ajuda da carta de busca - qual é a estrela variável e as estrelas de comparação que estão ao seu redor. Escolhe-se duas estrelas que servirão de comparação: uma mais e outra menos brilhante que a variável naquele momento. Isso é feito por simples comparação. Como a carta oferece várias estrelas de comparação, o observador escolherá, é claro, aquelas que mais se aproximam da variável em brilho. Se a variável está mais brilhante que duas estrelas, uma de mag. 7.1(c) e outra de mag. 7.5(d) e estiver mais fraca que duas outras estrelas, digamos de mag. 5.8(a) e mag. 6.3(b), é evidente que você escolherá as de mag. 6.3 e mag. 7.1, pois a estimativa de brilho ficará mais precisa. O método fracionário de estimativa é o mais indicado e o mais simples. No exemplo acima, se a variável parecer que está exatamente com brilho intermediário entre as estrelas de mag. 6.3(a) e mag. 7.1(c), então temos:
63(a) . | . | . | . | . | . | . | . 71(c)
Sua estimativa ficará assim: (a) 1 v 1 (c) = mag. 6.7
Pode ser entendida da seguinte maneira. A variável apresenta o mesmo intervalo de brilho entre as duas estrelas. Mas, se o observador achasse que a variável está mais próxima em brilho da estrela de mag. 6.3(a) que a de mg. 7.1(c), então sua estimativa poderia ficar assim:
63(a) . | . | . | . | . | . | . | . 71(c)
Sua estimativa ficará assim:(a) 1 v 3 (b) = mag. 6.5
Que pode ser entendida como: a variável está mais próxima em brilho de (a) do que de (b) na relação de 1 para 3 (ou 2 para 6)
Pode ser que a variável se encontre em um brilho que você julgue igual ao de uma das estrelas de comparação o que resultará em v = (a), ou v = (b). Também pode ocorrer que você simplesmente não veja a variável, por ela estar mais fraca que seu limite instrumental. Neste caso você escolhe a estrela mais fraca observável, por exemplo (d) mag.7.5, e sua estimativa ficará assim: v < 7.5. A estimativa é algo absolutamente pessoal e caberá unicamente ao observador a conclusão de sua impressão do que vê, não deixando se influenciar pela opinião alheia. Com a experiência o observador se acostumará a realizar a estimativa automaticamente à medida que se familiarize com o campo visual.
Anotando as Observações
Data
Hora
Nome da Estrela
Magnitude da Variável
Estrelas de Comparação
Carta de Busca
Observação/Anotações Gerais
O Dia Juliano
No sec. XVI o astrônomo francês Joseph Scaligero propôs a utilização do Dia Juliano como forma de contagem de tempo para finalidades astronômicas. Trata-se de um calendário que tem como início o meio-dia de 1° de janeiro do ano de 4713 antes de Cristo sendo contado a cada 24 horas. O astrônomo inglês Norman Pogson, que viveu no sec. XIX e se notabilizou entre outras coisas pelo estudo da magnitude estelar, propôs então que o Dia Juliano fosse utilizado para o registro das observações de estrelas variáveis.
Tábua de Dias Julianos (válido para 2002)
jan, fev, mar, abr, mai, jun, jul, ago, set, out, nov, dez Tábua de Frações de Dia Juliano
Vamos a um exemplo de conversão de data normal para dia juliano.
a) transformar a hora de TL para TU
b) encontrar a fração do dia juliano
Hoje em dia, com as facilidades da internet, podemos acessar páginas que fazem esta conversão em formulários online:
Calculadora/conversora de dia Juliano - online da AAVSO
Ou esta planilha:
Conversor para dia Juliano (14 KB) - planilha para converter uma data e hora UT (dd/mm/aaa hh:mm:ss) em dia Juliano fracionário e vice-versa.
Recomendamos vivamente os seguintes softwares:
1 - VAROBS - Variable Stars Observer's Software, desenvolvido por Patrick Chevalley. Além da conversão, possui um Banco de Dados com mlhares de estrelas do GCVS e ainda informações utilíssimas ao observador.
Fontes de Erros
Uma estimativa visual sob boas condições de observação pode definir diferenças de até 0.1 mag. no brilho de uma estrela. Muitos observadores experientes acompanhando a mesma estrela e usando as mesmas cartas de busca produzirão um resultado surpreendente.
a) Erro de Identificação.
b) Vício de lembrança (ou "bias").
c) Visão indireta.
d) Instrumento.
e) Erros Variados.
Texto preparado por Antonio Padilla Filho
Fonte de consulta:
Todas as suas observações devem ser anotadas em um caderno próprio ou gravadas em computador, utilizando o programa de sua preferência: Word, Excel, Notepad, enfim o que achar mais conveniente. A vantagem do Excel é a possibilidade de gerar curvas de luz a partir de suas observações. O registro da observação deve conter os seguintes dados:
Dia, mês e ano da observação.
hora e minutos da observação, expressos em Tempo Legal ou, preferencialmente, Tempo Universal (TU=TL+3horas), prestando atenção neste caso para a mudança da data. Exemplo: dia 02/10/2002 22:30 hs TL é igual a dia 03/10/2002 01:30hs TU.
Acerte seu relógio!
Anota-se o nome da variável observada, usando sempre a abreviatura do caso genitivo do nome da constelação. Exemplo: R Car, R Aql, RV CVn, U Sge, V4743 Sgr, etc. Também será útil anotar a designação AAVSO da variável, pois ela será requerida quando for reportar suas observações.
Registra-se a magnitude visual encontrada, com aproximação ao décimo. Caso a variável esteja além de seu limite instrumental, verifica-se a magnitude da estrela mais fraca no campo e anota-se. Exemplo: V (10.8.
Anotam-se as magnitudes das estrelas usadas como comparação, sempre duas de preferência. Há casos em que a carta de busca oferece poucas opções de estrelas de comparação e o observador terá que se desdobrar com uma mesmo. Neste caso a margem de erro poderá ser maior.
Menciona-se a origem da carta de busca utilizada e sua numeração: AAVSO, ASSA, RASNZ, Agrupacion Telescopium, etc. No caso da AAVSO as mais usadas são: a) AAVSO Star Atlas - código A, que pode ser acompanhado do número da prancha - A1, A96, A135 até A178 (última). b) Cartas Standard - código S acompanhado pelo ano da revisão da carta - S1948, S1980, etc. c) Carta Preliminar - código P acompanhado do ano - P1999, P2002, etc.
Anotam-se aspectos que podem ter interferido na estimativa como luar intenso, névoa fina, vento forte, observação ao crepúsculo, estrela brilhante próxima, falta de estrelas de comparação, etc.
As datas das observações de variáveis devem ser reduzidas a este sistema, portanto o observador deve conseguir uma tábua de Dias Julianos e também uma folha contendo a fração destes dias para cada hora e minuto. Como exemplo, disponibilizamos aqui uma cópia da tábua de Dias Julianos publicada pela AAVSO para o ano de 2002. Embaixo do dia do mês encontra-se o dia juliano, que deve ser somado a 2450000. Exemplo: 25 se setembro de 2002 = 2452543.
Suponhamos que você tenha feito uma observação às 22:30hs (TL) do dia 2 de outubro de 2002. Como converter esta data?
22:30hs (TL) equivale a 01:30hs (TU). Note que este horário agora (TU) refere-se ao dia 3 de outubro. Entretanto o dia juliano começa ao meio-dia (TU) e neste calendário ainda estaremos no dia 2, portanto o dia juliano é 2452550
Lança-se mão da tábua de fração de dia juliano e consulta-se 13:30 hs. Sim, porque na realidade passaram-se 13 horas e 30 minutos desde o meio-dia de 2 de agosto. Encontramos a fração 0.5625.
O dia juliano da observação realizada em 2 de outubro às 22:30hs (TL) é 2452550.5625.
A atenção deve ser dirigida sempre à virada da data em TU, lembrando-se sempre que o dia juliano inicia ao meio-dia.
Mas se você quiser evitar todo este cálculo, a Internet possibilita algumas boas notícias! Existem softwares gratuitos que farão a determinação da Data Juliana automaticamente, desde que você forneça a data-calendário e a hora TU de sua observação!
2 - PCOBS - Software desenvolvido por Leonard Abbey para a AAVSO. Tem a vantagem de preparar os seus dados para envio imediato, tanto para a REA como para a AAVSO propriamente dita.
É comum o observador comparar seus resultados com o de outros colegas e uma vez ou outra encontrará diferenças. Se forem pequenas - na ordem de 0.1 mag. a 0.2 mag., isto se encontra perfeitamente dentro da margem de erro esperada. Entretanto, deve se estar atento a erros sistemáticos em suas estimativas, e procurar a origem de tais discrepâncias. Aqui listamos algumas prováveis fontes de erros:
Equívoco no reconhecimento da variável ou estrelas de comparação. Lembre-se que a variável pode estar além de seu limite instrumental e, portanto você não poderá vê-la. Deve-se perscrutar muito bem o campo visual, criando figuras geométricas entre as estrelas de comparação. Na maioria dos casos, a carta de busca estará certa!
Evite, ao máximo, consultar as observações anteriores antes de realizar as estimativas do dia. Também deve ser respeitado o intervalo recomendado entre as estimativas. Para as variáveis tipo Mira, uma estimativa a cada semana é o suficiente. Para as semi-regulares e Irregulares, uma observação a cada seis dias. Variáveis RCB e cataclísmicas devem ser vigiadas todo dia. As Eclipsantes e Cefeidas devem ser acompanhadas dentro de projetos específicos de observação, procurando conhecer previamente as características da variável e estabelecer critérios próprios de acompanhamento.
Com a experiência de observação instrumental, o aficionado irá perceber que, ao se deparar com um campo visual, determinadas áreas de sua retina são mais sensíveis, podendo perceber estrelas mais débeis. Na realidade, o centro de nossa retina é composto por determinado tipo de células, chamadas cones, que têm seu pico de sensibilidade no verde - 5600?, enquanto que a região periférica (bastonetes ), tem sua maior sensibilidade no azul-esverdeado - 5100?. Uma estrela vermelha olhada com o centro da retina, e que tenha o mesmo brilho que estrelas brancas adjacentes, parecerá mais brilhante que estas, observadas com a região periférica da retina. Portanto o observador deve se cercar de todos os cuidados para manter sempre o mesmo procedimento em observações da mesma estrela. Muitos observadores notam - e isto é um fato - que observar por prolongado tempo uma estrela vermelha no campo visual terá como conseqüência a impressão que a mesma se torna mais brilhante. Uma maneira de contornar este problema e dar olhadelas rápidas no campo visual, procurando chegar a uma conclusão consistente.
De preferência, deve-se acompanhar sempre a mesma estrela com o mesmo instrumento. Se uma variável é brilhante ao longo de todo seu ciclo de variação o suficiente para ser acompanhada à vista desarmada, não há necessidade de usar binóculos. Se uma variável tipo Mira, na sua trajetória de aumento de brilho chegar a ser visível a olho-nu, o observador deve continuar usando o binóculo para realizar sua estimativa. Isso evitará um pequeno salto na curva de luz, proveniente da mudança de instrumento para olho-nu.
Sob determinadas condições observacionais a estimativa pode ser afetada por fatores diversos: variáveis próximas à Lua (luar intenso); próximas ao horizonte; névoa fina; vento forte, com imagens saltando no campo visual; observações ao crepúsculo; variáveis próximas a estrelas muito brilhantes. Evidentemente não se deve deixar de realizar a estimativa, mas é importante que se mencione em suas anotações o fator que interferiu na observação.
Revisto e atualizado por Tasso Napoleão (2004)
Codificação em HTML por José Agustoni
Webb Society Deep Sky Observer's Handbook, vol. VIII, Variable Stars, John Isles (autor). Enslow Publishers, USA, 1990.